quarta-feira, 28 de dezembro de 2022

Um Cão no Meio do Caminho = Isabela Figueiredo

  



Gostei muito de conhecer o José Viriato, gostei mesmo. Gosto da sua paixão pelo lixo dos outros sem deixar de ser pragmático (tão eu), gosto da sua paz, da paz da sua rotina, da paz que ele coloca na sua rotina, claro que gosto do amor que tem aos animais e gosto dele porque é boa pessoa.

O livro tem mais gente, tem uma vizinha acumuladora, uma avó à antiga, uma mãe professora e um pai comunista (descrições tão simplistas, eu sei, nada justas). Mas para mim foi o José Viriato que ocupou cada página com a sua forma de estar na vida. 

"Fui bom aluno, é certo, mas nunca gostei da escola. Nunca me conformei com as regras. Tive chatices com colegas e professores. Nunca me deixei contagiar por hábitos com que não concordasse. A maior parte das situações em que somos colocados merecem um veemente não. Eu não faço isso. Não colaboro. Não vou. Fui esse rapaz. Dizia não concordo, não é correto. As pessoas tudo aceitam por educação, para não ter problemas. É a melhor forma de viver. Agora percebo."

Terei de concordar em discordar com o José Viriato nesta última parte, para mim não é a melhor forma de viver, pode ser a mais "fácil", mas não é a melhor. Às vezes o preço, por dizermos esse não, é alto... a exclusão... a solidão... mas eventualmente encontraremos pessoas perdidas como nós e conseguiremos acreditar naquela imagem romântica de "que ninguém entra na nossa vida por acaso". 


Caminho 

292 páginas 



terça-feira, 27 de dezembro de 2022

O Evangelho segundo Jesus Cristo @ José Saramago


Não sei quantas foram as vezes que já li, ouvi ou vi a história de Jesus. Sei que gostei de o conhecer em todas as versões. Não sei ainda onde estão os limites do quanto a religião, que foi criada depois da sua morte, me marcou e me moldou.

É impossível dissociar Jesus da instituição Igreja Católica e ao mesmo tempo podemos claramente ver o que é um e o que é a outra. É impossível não aceitar que se é a história mais conhecida do mundo, e uma história bonita, deixou também um rastro de sangue e sofrimento.

E Saramago diz-nos que esse sangue só existiu porque para Deus os fins justificam os meios, porque a sua vontade de conquistar o mundo a outros Deuses se sobrepôs a todo o sofrimento que isso causou.

Saramago não é meigo para o Pai de Jesus, não lhe perdoa a ambição e expõe o seu lado caprichoso e corriqueiro:

"Senhor, diz-me, Cala-te, não perguntes mais, a hora chegará, nem antes nem depois, e então saberás o que quero de ti, Ouvir-te, meu Senhor, é obedecer-te, mas tenho de fazer-te ainda uma pergunta, Não me aborreças, Senhor, é preciso, Fala, Posso levar a minha ovelha, Ah, era isso, Sim, era só isso, posso, Não, Porquê, Porque ma vais sacrificar como penhor da aliança que acabo de celebrar contigo, Esta ovelha, Sim, Sacrifico-te outra, vou ali ao rebanho e volto já. Não me contraries, quero esta, "

Deve ter sido o tom que fez com que a Igreja Católica também não perdoasse Saramago. Isso e o facto de Jesus e Maria Madalena serem amantes (no sentido mais belo que esta palavra pode ter, diga-se de passagem). 

Mas é apenas um livro, maravilhosamente bem escrito, mas apenas um livro escrito por um homem... tal como a Bíblia, um livro escrito por homens. 


Caminho

445 páginas