sábado, 24 de junho de 2023

Três ֍ Valérie Perrin

Quando acabei "A Breve Vida das Flores" poderia ter começado logo o "Três" mas não o fiz.

Não quis que a sensação maravilhosa, com que Valérie me tinha inebriado, continuasse com outras personagens. Decidi meter outros livros pelo meio e ao mesmo tempo tentar prolongar aquela sensação tão boa. 

Também é verdade que tinha medo de descobrir que este novo livro não me traria a mesma emoção.

Mas trouxe... E mais uma vez fiquei abismada com a brutalidade com que a doçura desta escritora me atingiu. De repente percebo que estou dentro da história, que sinto as emoções de cada um dos três, que as sinto até às entranhas... 

Fico novamente com a vontade de prolongar este inebriamento... não sei se o vou conseguir... mas sei que poderei sempre resgatar uma réstia quando me lembrar do "Três". 

"E depois há o verão. O verão pertence a todas as lembranças. É intemporal. É o cheiro que é mais duradouro. Que se agarra às roupas. Que se busca toda a vida. Os frutos mais doces, a brisa marítima, as bolas de Berlim, o café escuro, o protetor solar, o pó de arroz das avós. O verão pertence a todas as idades. Não há infância nem adolescência. O verão é um anjo."

"Depois de Emmanuel, Nina percebeu que não se constrói nada com ninguém, nem para ninguém. Uma existência funda-se por si e se, por milagre, se encontra uma alma um pouco irmã, é um bónus."

461 páginas 
Editorial Presença 

segunda-feira, 22 de maio de 2023

A Breve Vidas das Flores ֍ Valérie Perrin


Enquanto li este livro andei inebriada com a doçura da escrita de Valérie, com a doçura da energia de Violette. 
Quando crescer quero ser como ela, quero ser generosa com os que me rodeiam, com os que me procuram, com os que me encontram. Quero ter a noção da maldade e da pequenez dos outros nos momentos em que o são, mas conseguir não alimentar o rancor dentro de mim e conseguir também ver os outros para além desses momentos. 
Tão difícil, tão difícil...  
Valérie obrigada pela Violette, obrigada por esta bela mulher que cuida dum cemitério com beleza e amor e tem dois guarda-fatos, um para ela e outro para os outros.

"Subo ao quarto e abro o guarda-fatos de inverno para enfiar um roupão. Tenho dois guarda-fatos. Um a que chamo de "inverno" e outro, de "verão". Os nomes não têm nada a ver com as estações, mas com as circunstâncias. O guarda-fatos de inverno só contém roupa clássica e sombria, destinada aos outros. O guarda-fatos de verão só contém roupa clara e colorida, destinada a mim. Uso o verão por baixo do inverno e dispo o inverno quando estou sozinha."

O que vou fazer agora sem ela??? 

Editorial Presença


 



segunda-feira, 20 de março de 2023

Almoço de Domingo // José Luís Peixoto

Neste Almoço de Domingo celebra-se o amor à terra, celebra-se o respeito a outras terras, celebra-se a capacidade de sonhar, celebra-se a justiça de se conseguir chegar onde se quer quando se trabalha para isso, celebra-se o saber ser rico, celebra-se o ser uma palavra segura, amiga e positiva em cada momento, celebra-se o ser amigo, pai, filho, sobrinho, irmão, marido, celebram-se 90 anos de tudo o que é realmente importante... 

... celebra-se a memória e cria-se a imortalidade de alguém que é um exemplo e que merece ser imortalizado "apenas e só" por tudo o que representa e fez. 

"Este homem fala, tem um fio de prata colado à pele do peito e, de repente, o embate. O rapaz aparece na frente do automóvel, o seu corpo é todo feito de braços e de pernas. Depois do estrondo da chapa, há a confusão dos braços e das pernas, o corpo enrolado a avançar sobre o capô e para-brisas, o travão a fundo. Quando o carro se imobiliza, o silêncio é terrível, dura um segundo. O homem está aterrorizado, não quer ouvir quando lhe digo para irmos ver, mas abro a porta, não espero. O rapaz está caído lá ao fundo. Começo a caminhar, passos seguidos e uniformes. Não sei que idade tem, este rapaz é um menino, não se mexe. O homem da empresa de exportação está a meio caminho entre o corpo caído e o automóvel, mal estacionado. Há outras crianças, o espanto de outras crianças, há barracas na paisagem, algumas quase à beira da estrada, há árvores gastas, há galinhas e pintos. O homem diz-me para irmos embora, diz que eles nos vão matar. Respondo-lhe que não vamos embora."


Quetzal

257 páginas